Água não dá trégua no Rio Grande do Sul e gera temor de desabastecimento
Parou de chover, mas a água ainda inundava, nesta segunda-feira (6), Porto Alegre e centenas de outras cidades do Rio Grande do Sul, enquanto aumentava a preocupação com o desabastecimento de água e alimentos, em meio à pior catástrofe climática na região.
Um total de 83 pessoas morreram, 111 estão desaparecidas e mais de 129 mil tiveram que deixar suas casas devido às chuvas torrenciais, que provocaram o aumento do leito dos rios e causaram deslizamentos de terra no Rio Grande do Sul, segundo a Defesa Civil.
O sol apareceu hoje em Porto Alegre, mas vários bairros continuavam inundados. A catástrofe multiplica as cenas de desespero. Centenas de moradores da cidade, de 1,4 milhão de habitantes, dedicavam-se a ajudar pessoas presas em suas casas.
No bairro de São João, os barcos chegavam às dezenas, mas os moradores temem que eles sejam insuficientes. Uma centena de pessoas aguardavam o resgate presas em um prédio. "Temos que resgatá-los e levá-los para algum abrigo", disse o funcionário público e voluntário Andrey Rocha, de 36 anos.
O fenômeno meteorológico que resultou em volumes de chuva históricos e transformou as ruas em rios foi atribuído por especialistas e pelo governo federal às mudanças climáticas.
- 'Cenário de guerra' -
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, descreveu hoje a situação como "um cenário de guerra". O rio Guaíba, que divide a cidade, chegava a 5,26 metros nesta tarde, acima do recorde de 4,76 metros registrado durante as inundações históricas de 1941, após atingir um pico de 5,30 metros.
A tragédia atingiu 364 cidades e povoados gaúchos, uma vasta região agrícola, com uma população de 11 milhões de habitantes. Muitos permanecem isolados, sem comunicação nem serviços básicos.
O tráfego em cerca de 200 estradas e rodovias foi interrompido, depois que as águas arrastaram pontes e vias. Militares, bombeiros e voluntários continuam trabalhando contra o relógio em tarefas de resgate com helicópteros, barcos ou botes. Quase 14 mil soldados foram mobilizados na região, segundo o governo.
- 'Zonas desabitadas' -
A Prefeitura de Porto Alegre decretou racionamento de água. "Não estamos encontrando quase nada no mercado. Já faz três dias que estamos sem água", contou Neucir Carmo, de 62 anos, morador do bairro Floresta.
O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) alertou para novas tempestades de grande perigo em áreas do sul do estado, com chuvas de até mais de 100 mm, ventos e, possivelmente, granizo, até o meio-dia desta terça-feira. Nas áreas mais afetadas, a chuva pode voltar na quarta-feira.
- Recursos e solidariedade -
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu-se hoje com parte do seu gabinete a fim de discutir ações para recuperar o estado, publicou na rede social X. Ele prometeu que vai agilizar a entrega dos recursos necessários.
O governo do Rio Grande do Sul informou que recebeu doações de todo o país e que arrecadou cerca de 38 milhões de reais.
A Confederação Brasileira de Futebol, em conjunto com federações, clubes e jogadores da seleção, lançou na internet uma campanha de arrecadação.
Na central logística da Defesa Civil e em centros esportivos de Porto Alegre, assim como em pontos fora do estado, doações se acumulavam para serem distribuídas. Mais de 20 mil pessoas estão alojadas em abrigos, e hospitais de campanha foram instalados, devido à evacuação de centros médicos.
Em meio ao cenário dramático, há quem tema a ocorrência de saques, apontou o policial Dionis Bellettini, vestido à paisana. Alguns moradores simplesmente "não querem ir para abrigos”. No centro da cidade, socorristas detiveram duas pessoas que roubavam residências evacuadas. Policiais evitaram um linchamento.
A.Ferraro--NZN